Sobreviver em tempos de desumanização

O homem mais rico do mundo age como se fosse CEO da América, fechando agencias inteiras, estabelecidas pelo congresso. Nas horas vagas participa de eventos de partido nazista. Tudo sem nenhum tipo de freio ou responsabilização. Este mesmo homem declarou uma cruzada pessoal contra o "woke mind virus", mentalidade progressista que seria culpada pela transição de sua filha, Vivian Wilson, ainda menor de idade. O processo de transição teve consentimento assinado do pelo pai, que agora declara que seu “filho está morto".

Há um mês, num gesto de obediência antecipada ao novo regime, a Meta afrouxou filtros de segurança, apagou marcações de orgulho LGBT+ e cortou contratos com verificadores de fatos. Agora, até rotular pessoas LGBT+ como doentes mentais é permitido, ignorando décadas de luta contra a patologização de nossas identidades.

Enquanto discutimos os gestos desses "grandes homens", não podemos esquecer das pessoas que sofrem os maiores impactos de suas ações. Discursos de ódio, quando normalizados, produzem agressões concretas. Nas últimas eleições, a Sentinela, nosso programa de combate à violência política, identificou mais de 1.000 comentários transfóbicos em um único vídeo de uma candidata. Em novembro de 2024, o corpo de outra candidata trans foi encontrado degolado.

Embora tenhamos alcançado recordes de participação política e sucesso eleitoral, nossas lideranças enfrentam ameaças constantes de estupro e de morte. As deputadas federais Erika Hilton e Duda Salabert, por exemplo, precisaram de escolta armada e colete à prova de balas em suas campanhas.

Estamos em um prelúdio cruzado de Matrix, com nossas realidades sendo manipuladas por elites tecnológicas, e The Handmaid's Tale, onde direitos básicos vão sendo retirados à força. De um lado, bilionários transformam monopólios de comunicação em palcos para ideais supremacistas, lucrando com o ódio e a desinformação. Do outro, a erosão implacável das liberdades e instituições. Não estamos assistindo a uma distopia fictícia, mas a um roteiro real acontecendo diante de nós. Nas próximas cenas, muitas pessoas vão morrer. Seja por agressões físicas, deterioração da saúde mental, desamparo ou abandono, as recentes medidas contra pessoas trans vão deixar um rastro ainda maior de sangue. 

Nossas transcestrais nos ensinaram que só chegamos até aqui porque cuidamos umas das outras. Não vai ser fácil. Haverá muitos incentivos financeiros para quem ceder, e muitas pessoas e empresas que já estiveram ao nosso lado vão capitular, assim como a Meta, à nova "tendência de mercado". Mas, para quem se considera uma aliada de verdade, é hora de agir. Fortaleça as marchas trans e as paradas, apoie organizações, contrate pessoas trans. E se não puder apoiar publicamente, faça isso na miúda. Precisamos de você ao nosso lado. Mais do que nunca.

gui mohallem

contemporary artist and activist for human rights and LGBT rights in Brazil

https://guimohallem.com
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